23 setembro 2016

A humilhação coletiva de uma cidade


Como vimos cerca de duas centenas e meia de pessoas foram castigadas pelos tumultos do Porto em reação à criação Real Companhia de Vinhos do Alto Douro, entre as quais, cerca de três dezenas condenadas à morte.
O Cabido da Sé do Porto apelou à clemência por intercessão das mais altas individualidades do reino, mas de nada valeu. Em cartas dirigidas ao rei, aos seus irmãos, ao Cardeal patriarca, ao Núncio Apostólico, ao Bispo eleito do Porto, ao Duque de Lafões e ao próprio Sebastião José de Carvalho e Melo afirmava-se que os factos foram extrapolados e que era apenas uma ínfima parte do Povo que interferiu nos acontecimentos e nunca houvera a intenção de ofender sua majestade.
A sentença foi aplicada de forma implacável com a única nuance do marquês ordenar à Misericórdia do Porto que tomasse conta dos órfãos que eram deixados, consequência da condenação à pena capital dos seus progenitores, num total de vinte e três. Resolução pouco importante face à natureza dos castigos, apenas serviria para mostrar à opinião pública a benevolência do Rei.
A seguinte grande humilhação coletiva foi o de sujeitar a cidade invicta a um controlo militar. No dia da chegada do Procurador Real com ele veio o Regimento de Dragões de Aveiro. segundo os autos exarados tivera um breve confronto com a população ciosa ainda da sua liberdade. A este primeiro contingente juntaram-se os Regimentos de Infantaria de Bragança e de Viana do Castelo e o de Cavalaria de Chaves, num total de 3000 homens. Acresce a este castigo um mais pesado que consistiu na obrigação de aboletamento de todos aqueles militares, isto é a obrigação de pagamento do seu alojamento e alimentação. O pagamento era suportado por imposto a que se denominou “contribuição militar” que aos poucos os habituais privilegiados foram saindo, restando o povo. Foi, pois, sobre a arraia-miúda que recaiu a obrigatoriedade do pagamento do aboletamento chegando a Câmara a queixar-se de famílias terem de vender roupa e móveis. Estranho fado este, trezentos anos volvidos, porque quem paga são os mesmos de sempre
No dia 10 de abril de 1757 foi decretado por carta real a extinção da Casa dos Vinte e Quatro que era o organismo representativo dos mesteres e que indicava à Câmara o juiz do Povo, verdadeiro governador da cidade. Este privilégio só seria restituído à cidade em 4 de abril de 1795 por decreto do príncipe regente.
A vereação foi substituída logo após o motim e este facto tem também de ser encarada como medida punitiva muito gravosa.
Por último, a execução dos condenados à pena capital teve foros de crueldade que visaram também o castigo coletivo e a humilhação. Assim os cadáveres esquartejados foram expostos durante largos dias e só após vários pedidos, o presidente da Alçada se dignou retirar as cabeças dos condenados e entretanto colocados nas saídas da cidade. Somente a 13 de agosto de 1760, quatro meses decorridos, foram retiradas as forcas espalhadas pelas ruas e subúrbios desta cidade” desde o tempo dos motins.

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