22 setembro 2016

Desobedecer ao rei é estar condenado à morte



Contada a história dos incidentes na forma de protestos contra a Companhia que começou com a revolta das tabernas e degenerou num levantamento populares das gentes do Porto a 23 de fevereiro de 1757, a seguir se narra a resposta do ministro de D. José.
A reação prova que ele não foi colhido de surpresa e estaria com certeza a par da insatisfação da população portuense. A abolição regional de um instituto que lhe era caro e se enquadrava na filosofia da política económica, protecionista e de monopólio que adotara para levar por diante o desenvolvimento do país e que era pedra angular do exercício do seu magistério. Para o marquês que era adepto de um poder central forte não “podia transigir com a contestação às ordens reais por parte de uma plebe ignara”. 
Cinco dias passados, a 28 de fevereiro, assinava o decreto em que nomeava João Pacheco Pereira de Vasconcelos, “Dezembargador do Paço e do meo Conselho” e concede-lhe todos os poderes, nos seguintes termos “sou servido conferir-vos toda a juridisção para os devidos efeytos sem restricção alguma, ordenando a todos os ministros a quem expedires as referidas ordens, cumprão vossos mandados pronta e exatamente”. Os poderes são totais para restabelecer a ordem e punir todos os implicados de um alto vexame à cidade, na opinião de muitos, a disponibilidade de todas as tropas que o Desembargador necessitasse, o burgo teria de as sustentar e aquartelar, como se pode ler no decreto exarado a 3 de março de 1757. Era nomeada pelo rei uma Alçada liderada pelo desembargador e equipada de meios humanos e materiais para se fazer “justiça” isto é mostrar a todos que desobedecer às ordens do soberano era estar condenado à morte.
O decreto de 28 de fevereiro revela um primeiro juízo sobre a situação que não mais se viria a alterar e constitui documento base para os executores da justiça. Os acontecimentos do motim da quarta-feira de cinzas são “delictos tão atrozes” que só o “prompto e severo castigo que sirva de exemplo aos maos” pode servir à Coroa.
Para punir bem e depressa foram dar plenos poderes ao ministro do rei e seus acólitos e a devassa prolongou-se de 15 de março a 24 de setembro. O marquês de Pombal mostra sinais de impaciência e manifestou em missivas várias a morosidade da aplicação da justiça. Em 18 de Agosto, o desembargador assegurava ao marquês que a justiça seria tão pesada que não mais haveria rebeliões em Portugal. Enganar-se-ia, pois, cerca de um ano depois, a 3 de setembro de 1758, aconteceria o regicídio. No entanto, a punição exemplar e desproporcionada.
Apesar da oposição de alguns juízes do tribunal da Relação o crime de lesa-majestade e a sua punição como tal havia de prevalecer com a argumentação de que a majestade não consiste só na pessoa do rei, mas também nas suas leis.
A sentença é um instrumento de humilhação de uma cidade briosa no seu poder e ciosa da sua liberdade e privilégios ancestrais. Dos quatrocentos e sessenta e dois suspeitos, os autos remetem para duzentos e sessenta e cinco réus e prova-se “plenamente” o crime cometido pela plebe de “Alta Traição” pois “esquecidos alguns dos seus habitantes da Religião, e da devida Fidelidade, em que sempre se distinguiram os vassallos Portuguezes, se atreverão a comover com a sua astúcia uma grande parte do ínfimo povo, que animado pelas vozes, dos que o concitarão, formou um Tumulto”.  Continua a descrição pormenorizada dos incidentes referindo-se nomeadamente que foram proferidos insultos a sua majestade caindo no horroroso crime de “LESA MAGESTADE da primeira cabeça”.
Vinte e seis pessoas foram condenadas à morte por enforcamento; cento e quarenta e dois castigados com diversas penas que iam desde açoites, condenação a galés e confiscação de bens até à obrigatoriedade de assistir ao suplício dos sentenciados; sessenta e três foram condenados a seis meses de prisão: cento e noventa e cinco foram mandados soltar após diversas audiências e apenas trinta e seis foram absolvidos.

Seguidamente daremos conta dos motivos da redução das tabernas da cidade a um número certo e a confirmação absoluta da Companhia do Alto Douro, se apontam os principais cabecilhas e se refere o restante enredo deste tumulto.

Sem comentários: